quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Baladinha








''Minha vingança será um sorriso carimbado na face e o éter a me escorrer das mãos''



  - Jura que já houve quem experimentasse tudo isso e ainda assim abrisse mão? Digo, se hoje estás aqui é porque alguém desistiu... ou você se cansou... afinal... – é quando batem a porta para interromper o idílio que é o infinito preguiçoso de uma tarde quente  de segunda.
   
  Era o vizinho, como sempre, incomodado. Curioso. Pouca coisas  há capaz de incomodar um ser humano que um seu semelhante em estado de graça. Poucas coisas evocam mais a desgraça, é dizer. Um carro do ano. Uma mulata passista em mão alheia ou um gemido alto  o bastante para furar a privacidade das paredes  cotidianas.

  Ele, o vizinho, senhor honesto e trabalhador. Por vezes recebeu troco errado e com ele ficou. Quem pode culpa – ló? O homem que tem por predicados ser tão homem quanto todos os demais, nem mais nem menos nobre. Aquele que não fede e não cheira, não fuma nem nada. Senhor das virtudes normais do Mundo normal da natureza humana. Classe: Medíocre. Aura: Mediana.

  Ficaram os dois em silêncio e recolhidos  sob os lençóis úmidos de seu paraíso particular. Assim mesmo, como em um romance barato de banca entre jovens adultos que ainda não puderam romper a casca do adolescer. Tudo  silêncio e pieguice,  não fosse o arfar pesado das suas respirações ansiosas. O vizinho batendo, batendo e bufando, até cansar. Não dava trégua em suas reclamações pequenas e egoístas. “O barulho vai muito alto, vizinho!” se recebiam amigos para uma conversa simples. “Preciso dormir, ora essa!” se havia música para animar o encontro. ”Vocês fumam demais! Que cheiros  são esses?” e por aí em diante, ou seja, não se pode mais jantar. Não se pode ter amigos, ser feliz  é  crime agora?
Foi embora e não ouviu o riso abafado entre brincadeiras e travesseiros. Amor assim, de cama, mesa e banho. Ah! E álcool, claro. Que ninguém é de ferro. E somos tão jovens...

  A noite chega apontando planetas e estrelas ou o que mais que brilhe na seda escura do céu.  Estão cansados de nada, felizes por tudo e convictos: Ele é só dele. Ela não é de ninguém.

  -  Pede você, você sabe que eu não gosto de falar ao telefone.
  -  Pede o de sempre.
  -  Vem logo pra cá. Eu bem poderia te usar agora. Sabe, desde que eu me apaixonei por... 
  -  Cala essa boca, cara. Sente meu amor?  
  -  Que sorte a minha te conhecer! Meu bebê!

  Mais voltas, corcoveios. Cavalo e entidade, peão e rainha. Buddys. Um dia, porém, os enjoos. O suor incomoda, a emoção que acabou, o “liga você, olha a frescura”.  Por fim as retas paralelas, os “olhos nos olhos” e o “passar bem”. O anacrônico sentimento da traição que não houve.

  Se encontrarão ainda nas noites, nos bares. Dois estranhos caminhando na turma de rostos conhecidos. Nada houve, parece. Não foi nada, já passou. Ah! Essa juventude transviada! Os encontros furtivos e os amantes passageiros. E no fim, como diz o outro: “Um enfarto. Ou pior,  o psiquiatra”


(I do. I do )




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