quinta-feira, 31 de maio de 2012

Corredor



Arrumei a casa pela última vez, era temporada invernosa de 40 graus, sentia o espírito fervendo mais uma vez. Palidamente, me escondia perto das almofadas acinzentadas da malfadada poltrona. Perdida nesta abertura dialética, vejo os olhos negros castanhos, mofados pela TV clichê; perto desta, um gato decrépito pede ajuda por morte preguiçosa, sem devaneios, a mesma tranquilidade de um recife, é paz nesta guerra mental, de romances perfeitos e amores desfeitos. Forte, a espreita na porta, vive um senhor, sempre febril, capitão do mato é caçador, preso em sua rede. O requeijão estragado, alimenta os ratos, sem saída deste destino, em suma, encurralado em um mesmo caminho, sobreviventes naturais, precisa-se deste alimento, custa um sonho, custa o tempo todo de uma juventude. O velho agora é meio incauto, meliante do próprio percurso, mata o sorriso astuto, resigna por meio do sopro amargoso do vento. Emoção, é o que nos resta, um bar em um álcool qualquer pra secar essa culpa.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

A capela



  A boca seca aponta a angústia de um tempo que não está no lugar onde deveria. Fora de hora. Mas quando o verbo se flexiona em tempo, que oração? Daí não sei se espero, se desespero e sumo daqui de uma vez. Desesperar não é tão fácil na medida que se pensa, viu? Desde a praia miro a meta e estou ainda úmido da imensidão vazia que me trouxe até aqui.

  Agora é subida. Chegar - te ao cume só mesmo pra dizer:  " Venci!"  Quantas braçadas dei de lá pra cá? Deus! Não sei. Mas vim, vi e o compasso, sei, jamais me obedeceu. Ao contrário! Pois que se eu que cego busquei meu Norte onde só frio havia, vento e mais nada.

  Assim creio, hei de secar, agora mais Ilhéu do que em qualquer momento, como morto mesmo indo caminho acima. Do nada ascendenrei - e não como pira, mas como o incenso - queimando lento e tonto na pequena capela que encara de cima o enorme e invencível azul.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Continua...




Amargando estradas dicotômicas, vestígios descalabros deste falperrista, inconfundível pela idade. Sem modelos, fora de orbita, surge mais cor, acaba-se dor. Outro ciclo, mais fervor, menos pessoal, mais garagem, menos fraqueza, menos amor, proxenetismo virá rei deste barco que não sabemos guiar, índole de adolescente encantado. Fez-se duro diante da nobre maneira de viver, passou incertezas de rancor do passado e futuro, doces ilusões; quase avistei a terra ou o térreo. Seu negativo.
Vivendo deste, dou-a em mim neste cangaço empoeirado que virá (a) mar, veia humilde e pacata.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Mikania glomerata

Privo-te de tua essência, pois da morte eu seria se não me saísse do peito.

O que andam pensando de mim? Eu não posso ser isso o tempo todo!
Acamado em minha sina, abraço as intenções como remédio, a cura da minha, da tua dor; a jura de amor às pressas, o olho da rua, a casa do portão. Os atos edificados pelas palavras do coração.
Caí duas vezes na mesma armadilha e a terceira urge na boca do gato em cima do muro da solidão. E olha que contei até três para saber se tinha alguma saída; se a ponte vê o rio que corre, se a chuva sabe amar a quem molha. É, parece que tem tanta humanidade no desumano que a palavra deveria deixar de ser pejorativa.
Se sabe bem, a invenção quando criada já não é própria quando se cria. Tem forma na consciência alheia por tabela, sendo aquilo e aquilo outro, dependendo do que se patenteia. Teus olhos não possuem as mesmas minúcias, logo, os meus motivos não terão qualquer sentido para você. E eles grudam, sabe? como trepadeira usando a força de outro ser para se sentir sã. É como um blues que em baixa frequência vem repercutir seu grito.
Por fim, de mim, o maldito; bêtise por quem toma a relação como mito e vê teu senso assimilado ao caos e teu zelo tão frio quanto esta caneta que uso para escrever.
Acho que você é a ponte que não vê o rio. Ou será a chuva que nunca amou?

Assim, desse jeito, eu respiro e te escarro a ilusão do momento.


domingo, 20 de maio de 2012

* * *




Que belas flores me trazes! Desfolho uma a uma e me fica entre os dedos o úmido cheiro a morte que é   das flores tão natural. Debaixo da unha, a seiva, o sangue que delas brota. Sinto arder cada uma, como milhares de espinhos pinçando e rasgando desde estas veias tão verdes.

Ai! Quanta doçura em sinais tão despretenciosamente mórbidos, ai! Num canto do quarto esconde - se entre alvas cortinas o cântaro que sou , de onde brotam essas tais negras rosas, escuras como seus cabelos e densas como a noite só. Angustiantemente mina de minhas horas ultimamente a poesia, me secando os potes de mágoas e cancros.

O som crepitante dessa fabulosa flora se dissemina de tal maneira que a tudo abraça em sua velada sinfonia:  Não ouço sequer meu mais sentido suspiro. Observo cioso meu estrelado jardim, mansidão vegtal que sinto  pois sim, ainda me há de fazer um com o cosmos.


sábado, 12 de maio de 2012

O Norte da Lua


Há tempos não sabia o que era estar em casa. Esse zumbido, os cachorros latindo lânguidos e preguiçosos noite adentro, apenas fitando o vazio.

Parece até que a noite me pertence, ou será o contrário? Nem sei. Essa lua, essa cerveja...
Essa camisa não é minha. Essa camisa é a sua? Essa bandeira mal desfraldada, esse estandarte roto e puído?

Acontece é que lido sempre com o que é provável, por mais descabido que possa parecer. Sente isso, amor? Apenas se cale. Você é tão bonita!

Fauvismos a parte, todos sabemos: Mulheres que calam sabem de cor as tragédias que invocam.